Os conflitos e imprecisões da Lei da Ficha Limpa

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Marcelo Gurjão Silveira Aith*

Marcelo Gurjão Silveira Aith
Quase 5 mil políticos que pretendem concorrer nas eleições municipais deste ano podem ter os registros das candidaturas impugnados por serem considerados fichas sujas na Justiça. E a polêmica em torno das possibilidades de inelegibilidade dos candidatos condenados por crimes como lavagem de dinheiro, corrupção, peculato ou abuso de poder econômico é crescente. Para colocar ainda mais chama nesta fogueira, em recente entrevista, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Gilmar Mendes afirmou que a Lei da Ficha Limpa "parece ter sido feita por bêbados".

Gilmar Mendes está sendo “metralhado” pela declaração. A OAB criticou a declaração, colocando-se de forma favorável as inovações trazidas pela Lei Complementar nº 135/10. Da mesma forma alguns ministros do STF foram contrários à declaração de Gilmar Mendes.

No entanto, com todo respeito daqueles que pensam em contrário, e deixando o politicamente correto de lado, não faço ressalva alguma aos dizeres do Ministro Gilmar quando diz que “Essa lei foi mal feita”. Explico. O artigo 1º, inciso I, da Lei da Ficha Limpa traz o rol das inelegibilidades. Há neste rol algumas teratologias jurídicas, tais como exigir a presença, concomitante, dos elementos dolo, enriquecimento ilícito e danos ao erário  para a configuração da inelegibilidade daqueles agentes públicos condenados em segunda instância por ato de improbidade. 

Para aqueles que militam no direito administrativo hão de concordar que a presença, ao mesmo tempo, dos três elementos em uma decisão condenatória é algo improvável, o que torna a Lei da Ficha Limpa pouco aplicada em relação ao dispositivo.

Da mesma forma, temos em relação a alínea que trata sobre a rejeição de contas dos agentes públicos. Tal como ressaltado pelo Ministro Gilmar, a Lei da Ficha Limpa não é precisa, deixando um vácuo para as interpretações. No entanto, não podemos nos esquecer que se trata de uma norma restritiva de direitos, uma vez que retira do cidadão o direito de ser candidato, portanto, deve ser interpretada restritivamente.

Vale ressaltar também que decisão recente do STF pode beneficiar políticos que tiveram suas contas rejeitadas por tribunais de contas. No entendimento da maioria dos ministros, cabe, agora, A Câmara dos Vereadores dar a palavra final sobre o balanço contábil de políticos. Assim, candidatos que tiveram a contabilidade rejeitada pelo tribunal de contas da localidade poderão concorrer nas eleições se o balanço não tiver sido rejeitado pelo Legislativo.

O grande problema da Lei da Ficha Limpa, como das demais normas feita no calor da pressão popular, é o afogadilho, o que faz surgir no sistema jurídico brasileiro aberrações. É, sim, necessária uma urgente revisão da atual lei para que, pelo menos, nas próximas eleições não tenhamos tamanhas polêmicas e também se faça uma "peneira" mais justa entre aqueles que vão concorrer a importantes cargos públicos, como representantes do povo.

*Marcelo Gurjão Silveira Aith é especialista em Direito Eleitoral e sócio do escritório Aith Advocacia

  

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