A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ),
composta de 15 membros, decidiu enviar para o 1º grau, no Piauí, a ação penal
contra o governador Wellington Dias sobre o rompimento da Barragem de Algodões,
ocorrido há dez anos.
Com a decisão, o STJ fixou interpretação restritiva da
competência originária da Corte, no sentido de que o término de um determinado
mandato acarreta, por si só, a cessação do foro por prerrogativa de função, em
relação a ato praticado neste intervalo.
No caso, Wellington Dias foi denunciado por crimes de dano a
unidades de conservação e de poluição. O detalhe é que tais atos teriam sido
cometidos em mandato anterior - a conduta seria de omissão em adotar medidas
necessárias para evitar o rompimento da barragem de Algodões, ocorrido em 2009.
O STJ levou em conta que Wellington Dias foi governador entre
2003-2006 e 2007-2010 e, na sequência, foi eleito senador, antes de voltar a
comandar o governo estadual.
A relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, propôs
questão de ordem sobre a possibilidade de interpretação restritiva da
competência originária da Corte ser estendida a supostos crimes praticados por
governador em mandatos anteriores e já findos, estando a pessoa investigada ou
denunciada ocupando a função que garante a prerrogativa de foro em virtude de
nova eleição para o mesmo cargo.
Para a ministra, o foro por prerrogativa de função deve
observar os critérios de concomitância temporal e de pertinência temática entre
a prática do fato e o exercício do cargo, pois sua finalidade é a proteção do
seu legítimo exercício no interesse da sociedade.
Privilégio ilegal
Partindo deste entendimento, como a omissão supostamente
criminosa de Wellington Dias ocorreu no penúltimo ano de seu segundo mandato de
governador, a ministra Nancy do STJ concluiu que a manutenção do foro após o
hiato (quando foi senador) e mais um mandato no Executivo “configuraria
privilégio pessoal não abarcado pela garantia constitucional”.
A divergência foi inaugurada pelo ministro Raul Araújo, que
defendeu a competência constitucional da Corte para a análise e processamento
da denúncia: “O cometimento do suposto ato a ele imputado se deu no exercício
do mandato de governador do Estado. Ele permanece governador, agora que
reeleito. Temos a competência para julgá-lo.”
Na quarta-feira, 15, a ministra Laurita Vaz apresentou
voto-vista seguindo a divergência, por entender que se a prerrogativa de função
exige para resguardar o exercício do cargo, em caso de reeleição, consecutiva
ou não, deve persistir a competência do órgão julgador, e o fato de os supostos
delitos terem sido praticados em mandato anterior não tiram a prerrogativa de
foro, que é a ele inerente.
O entendimento da ministra Nancy, pelo fim da prerrogativa no
caso, foi seguido pelos ministros Humberto Martins, Maria Thereza, Herman
Benjamin, Jorge Mussi, Og Fernandes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell,
Benedito Gonçalves e Felix Fischer.
Sem portabilidade
A ministra Maria Thereza ponderou que “se fosse um mandato
sucessivo, sem solução de continuidade, até poderíamos amenizar o entendimento,
como fez o Supremo. Mas depois que ele terminou o mandato, se elegeu senador e
novamente governador. O fato de ser novamente governador não lhe dá o foro
privilegiado. Não se trata de reeleição contínua”.
Por sua vez, Herman Benjamin disse que “não podemos admitir a
tese de que o foro por prerrogativa de função sofre portabilidade, uma espécie
de caráter ambulante”.
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