Colaboração para o UOL, de Curitiba
O juiz Ralph Moraes Langanke Imagem: Divulgação/Câmara dos Vereadores de
Ibirubá (RS)
O juiz Ralph Moraes Langanke, da comarca de Ibirubá (RS),
disse ao UOL estar passando por uma situação financeira delicada. Apesar de
ganhar mais de R$ 19 mil por mês, cerca de 19 salários mínimos, ele afirmou ter
se endividado desde de que seu auxílio-moradia de quase R$ 2.000 mensais foi
cortado, após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).
E essa dívida, agora, tem o impedido de realizar seu trabalho
como magistrado. Por ser devedor do Banrisul (Banco do Estado do Rio Grande do
Sul), Langanke já se declarou suspeito para julgar cerca de 20 ações em que a
instituição financeira está envolvida.
"Em razão da redução real dos salários da magistratura
gaúcha provocada pela cessação do pagamento do auxílio-moradia (no meu caso, a
redução nominal do salário foi de quase R$ 2.000), tornei-me devedor do
Banrisul, visto que, para recuperar o limite do cheque especial, tive que
contrair dois empréstimos consignados, cujo pagamento será feito em 84
prestações mensais e sucessivas. Declaro-me suspeito para julgar a presente
ação", declarou ele, num processo.
"Salário injusto e defasado"
Langanke é juiz há 22 anos. Sempre trabalhou para a Justiça
Estadual do Rio Grande do Sul. Reclamou, porém, que o estado paga baixos
salários a seus juízes na comparação com outras unidades da federação.
"Não acho justo", afirmou ele, em entrevista.
"Pelo trabalho que exerço, pelo risco que corro todos os dias, acho que
merecia ganhar mais."
O juiz disse que tem
duas filhas pequenas. Desde que elas nasceram, suas despesas triplicaram. E vêm
subindo mês a mês, diferentemente do seu salário.
"Meu salário é bom para uma pessoa solteira. Para quem é
casado, tem duas filhas, é pouco."
Langanke reconhece que o valor que recebe mensalmente como
magistrado está bem acima do salário da grande maioria dos trabalhadores. Ele
reclama, porém, que chefes de estatais gaúchas ganham mais que um juiz.
"Um DJ que vai tocar na minha cidade por uma hora vai ganhar R$ 10
mil", complementou, citando Ibirubá, onde mora.
Segundo pesquisa do
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), um trabalhador
brasileiro, com mais de 14 anos, recebe em média R$ 2.234 por mês. A metade
mais pobre da população recebe em média R$ 820 por mês, ou seja, menos que um
salário mínimo (R$ 998).
Diárias garantem renda
extra
Langanke, aliás, ganha mais que os R$ 19 mil de salário
líquido todo mês, a depender de suas atividades. Em julho deste ano, ele
recebeu R$ 53 mil segundo seu contracheque. Em agosto, R$ 40 mil.
Ele disse que os
rendimentos extras foram pagos pois ele recebeu diárias por ter trabalhado como
juiz substituto em outra comarca. "Ainda vendi minhas férias, coisa que
nunca fiz na vida", disse ele.
Decisão para abrir
debate
Langanke afirmou que o
CPC (Código de Processo Civil) é claro com relação à suspeita de juízes
devedores. No artigo 145 do texto, o CPC diz que juízes são suspeitos quando
julgam um caso no qual são devedores ou credores de uma parte.
Ele acrescentou, porém, que usou suas decisões para abrir um
debate sobre os salários dos magistrados gaúchos. "Essa é uma discussão
que quero fazer", afirmou.
Depois de se declarar suspeito, o juiz já recebeu uma ligação
do corregedor da Justiça do Rio Grande do Sul.
Ao UOL, a corregedoria informou que não se manifesta sobre
decisões judiciais.
O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) não tem qualquer
procedimento relacionado a decisões ou à conduta do juiz Langanke. O órgão
informou, entretanto, que tem uma normativa expressa a respeito do pagamento de
auxílio-moradia a magistrados.
A resolução é de 1ª de
janeiro de 2019. Leva em conta a decisão do STF que suspendeu o pagamento dos
benefícios a juízes. Segundo ela, atualmente, só deve receber auxílio-moradia o
juiz que não tem imóvel na cidade onde trabalha, não ocupa imóvel funcional e
que trabalha em cidade diferente do seu posto de trabalho original.
Langanke trabalha na comarca de Ibirubá e reside na cidade.
Não tem, portanto, direito ao benefício, considerando a resolução.
Errata: o texto foi
atualizado
O artigo do CPC (Código
de Processo Civil) que indica que juízes são suspeitos quando julgam um caso no
qual são devedores ou credores de uma parte é o de número 145, e não 135 como
informado anteriormente.
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