Ministro Barroso, do STF Foto: Nelson Jr./STF |
Desde que assumiu a presidência do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), no último dia 25, o ministro Luís Roberto Barroso decidiu transformar a corte em uma "caixinha de sugestões" sobre como será realizada a eleição municipal deste ano em meio à pandemia.
Barroso tomou a iniciativa de marcar uma série de reuniões
por videoconferência com cientistas, médicos, juízes e acadêmicos do direito
eleitoral, com o objetivo de descobrir o cenário mais adequado para a votação.
Alguns desses médicos e cientistas voltarão a se reunir com
Barroso, em encontro virtual previsto para a próxima terça-feira (16), do qual
também participarão os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), além de líderes partidários.
Alcolumbre e Maia serão responsáveis por colocar em votação
no Congresso uma eventual PEC (proposta de emenda à Constituição) que trate do
adiamento da eleição, que tem o primeiro turno marcado para 4 de outubro.
Até agora, a maioria dos especialistas ouvidos por Barroso
defende que as eleições sejam postergadas para uma data ainda neste ano, sem a
extensão dos mandatos dos atuais prefeitos e vereadores. Eles sugerem também a
possibilidade de mudanças de locais de votação e até reservar horários
específicos para o voto de idosos.
Algumas propostas que demandariam alterações complexas, no
entanto, têm sido descartadas. Um desses exemplos é a de uma eleição que
aconteça em dois dias diferentes, um sábado e um domingo.
A postura atual de Barroso sobre o tema difere do que
aconteceu nos últimos meses da gestão da ministra Rosa Weber à frente da
presidência do TSE.
Ela delegou a tarefa da análise da viabilidade das eleições a
um grupo de trabalho interno, que verificava as condições técnicas da Justiça
Eleitoral. Esse colegiado vinha dizendo que há condições de fazer o pleito nas
datas previstas, apesar da pandemia da Covid-19.
"O presidente Barroso está muito aberto à interlocução.
É muito diferente a postura de uma presidência do TSE para a outra",
afirma a advogada Maria Claudia Bucchianeri, fundadora da Abradep (Academia
Brasileira de Direito Eleitoral e Político), que se reuniu com Barroso na última
quarta-feira (10).
A entidade é composta por advogados, juízes, membros do
Ministério Público e acadêmicos. Em abril, já havia apresentado ao TSE um
estudo com propostas sobre aspectos práticos e legais do adiamento da eleição
para alguma data ainda deste ano.
Uma das questões legislativas que devem ser analisadas pelo
Congresso, segundo Bucchianeri, é se a PEC que alteraria os dias da eleição
poderia também dar poderes a Barroso para mudar, por meio de resolução, outras
datas eleitorais fixas.
Alguns exemplos são o período das convenções (quando os
partidos escolhem seus candidatos) e o prazo de registro das candidaturas. Caso
esses poderes não sejam delegados à Justiça Eleitoral pela PEC, possíveis
alterações dessas datas também teriam que ser votadas pelo Congresso, por meio
de projetos de lei.
Em 1º de junho, Barroso participou de uma videoconferência
com os presidentes dos 27 TREs (Tribunais Regionais Eleitorais), que
unanimemente disseram que as eleições devem acontecer ainda em 2020. Eles propuseram,
também, a dispensa da necessidade de identificação biométrica do eleitor e o
alargamento do horário de votação.
"Em vez de terminar às 17h, pode terminar às 20h, por
exemplo", diz Jatahy Junior, presidente do Coptrel (Colégio de Presidentes
dos Tribunais Regionais Eleitorais) e do TRE da Bahia.
"Pensou-se também, mas esse não foi um posicionamento de
todos, em dividir a votação por faixa etária. Por exemplo, os idosos votam pela
manhã, e o restante da população, à tarde. Mas isso não seria impositivo, seria
por meio de uma campanha educativa", afirma o magistrado.
Os presidentes descartaram eleições em dois dias,
principalmente por causa da segurança das urnas eletrônicas durante a noite.
Outro grupo que conversou com Barroso foi o de médicos e especialistas em áreas
como estatística e biologia. Entre eles estavam os epidemiologistas Paulo
Lotufo, professor da USP, e Ana Freitas Ribeiro, representante do Observatório
da Covid-19.
"Foi uma reunião bastante objetiva. O ministro já tinha
um rol de perguntas e o tempo inteiro ele batia na tecla da segurança",
diz Lotufo. "Conversamos sobre as sugestões e fizemos a proposta mais
conservadora possível, do primeiro turno em 29 de novembro e do segundo em 20
de dezembro."
A perspectiva atual, no entanto, é a de realização do
primeiro turno antes dessa data, em 15 de novembro.
Ana Freitas Ribeiro afirma ter defendido que os eleitores
usem álcool em gel logo após a votação, já que o produto não pode ser passado
diretamente na urna eletrônica, sob o risco de danificá-la.
Na mesma ocasião, o presidente do TSE também conversou com o
biólogo e youtuber Atila Iamarino, doutor em virologia.
Segundo ele, que também é colunista da Folha, a mudança de
datas não é um fator decisivo para a segurança da eleição, até porque o
Ministério da Saúde, diz Atila, não conseguiu fazer um controle seguro da
epidemia no país que permita esse tipo de previsão.
"Eu entendo a mudança de datas para acomodar outras
coisas, como preparar melhor os mesários ou ter mais tempo para fazer o
recrutamento. Mas medidas são mais importantes do que os dias do ano",
afirma o pesquisador.
Atila diz que outros fatores importantes devem ser levados em
conta tanto pela Justiça Eleitoral quanto pelos municípios, como a
possibilidade de aglomerações durante a campanha.
Também deve ser debatida previamente, na opinião dele, a
forma como os eleitores se deslocarão até os locais de votação no dia da
eleição.
Atila cita como mau exemplo as aglomerações causadas para o
saque do auxílio emergencial. "Tudo o que dita a pandemia são ações
humanas, e essas são as mais imprevisíveis no Brasil", afirma.
Na reunião da próxima semana com Maia e Alcolumbre, estarão
presentes o biólogo e também médicos como o cancerologista Drauzio Varella e o
infectologista David Uip, ex-coordenador do Centro de Contingência do
Coronavírus em São Paulo.
"Tenho estudado que nem um louco", diz Uip sobre a
proposta que defenderá na videoconferência.
Procurado, o TSE disse que a partir das conversas Barroso
relatou a Maia e Alcolumbre "um consenso médico sobre a necessidade do
adiamento por algumas semanas -primeiro turno entre a segunda quinzena de
novembro e o começo de dezembro- a fim de realizar o pleito com maior segurança
e preparação para todos".
"Ficou ajustada uma conversa, mediada pelo ministro,
entre esses especialistas e os líderes partidários, por videoconferência",
afirmou em nota a corte eleitoral.
Fonte: Folhapress
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