![]() |
Ex-governadora Roseana Sarney (PMDB/MA) |
No dia 31 de outubro, a 2ª Promotoria
de Justiça de Defesa da Ordem Tributária e Econômica ingressou com uma Ação
Civil Pública por atos de improbidade administrativa contra 10 pessoas
envolvidas em um esquema de concessão ilegal de isenções fiscais na Secretaria
de Estado da Fazenda (Sefaz). O esquema causou prejuízo superior a R$ 400
milhões ao erário.
São alvos da ação o ex-secretário
de Estado da Fazenda, Cláudio José Trinchão Santos; o ex-secretário de Estado
da Fazenda e ex-secretário-adjunto da Administração Tributária, Akio Valente
Wakiyama; o ex-diretor da Célula de Gestão da Ação Fiscal da Secretaria de
Estado da Fazenda, Raimundo José Rodrigues do Nascimento; o analista de
sistemas Edimilson Santos Ahid Neto; o advogado Jorge Arturo Mendoza Reque
Júnior; Euda Maria Lacerda; a ex-governadora do Maranhão, Roseana Sarney Murad;
os ex-procuradores gerais do Estado, Marcos Alessandro Coutinho Passos Lobo e
Helena Maria Cavalcanti Haickel; e o ex-procurador adjunto do Estado do
Maranhão, Ricardo Gama Pestana.
As investigações do Ministério
Público do Maranhão, a partir de auditorias realizadas pelas Secretarias de
Estado de Transparência e Controle e da Fazenda, apontaram irregularidades como
compensações tributárias ilegais, implantação de filtro no sistema da
secretaria, garantindo a realização dessas operações tributárias ilegais e
reativação de parcelamento de débitos de empresas que nunca pagavam as parcelas
devidas.
Também foram identificadas a
exclusão indevida dos autos de infração de empresas do banco de dados, além da
contratação irregular de empresa especializada na prestação de serviços de
tecnologia da informação, com a finalidade de garantir a continuidade das
práticas delituosas.
COMPENSAÇÃO
O esquema irregular de
compensações tributárias baseou-se em um acordo, realizado em 2003, entre o
Estado do Maranhão e a empresa Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A. Dos
mais de R$ 147 milhões devidos à empresa, cerca de R$ 108 milhões deveriam ser utilizados
na quitação de tributos estaduais, ficando permitida a cessão de créditos a
terceiros. A Lei Estadual n° 7.801/2002, que permitia a operação, no entanto,
foi revogada em 2004, pela Lei Estadual n° 8.152.
Entretanto, mesmo sem lei
autorizadora, que é imprescindível nesses casos, a compensação de débitos
tributários com créditos da Construções e Comércio Camargo Corrêa tornou-se
prática constante na Sefaz a partir de abril de 2009. Somente de 17 de abril de
2009 a 31 de dezembro de 2014, foram efetuadas 1.913 compensações.
De acordo com as investigações,
as compensações e alterações no sistema da Sefaz eram feitos diretamente por
Akio Valente Wakiyama. A negociação dos créditos, por sua vez, era realizada
pelo advogado Jorge Arturo Mendoza Reque Júnior e os valores desviados eram
depositados em contas bancárias de Euda Maria Lacerda. Os três eram sócios na
empresa Centro de Tecnologia Avançada (CTA).
“Sem a abertura de processos
administrativos de memória de cálculo e com a implantação do filtro, ocorria
tranquilamente a liberação da compensação sem previsão legal e, pior ainda, sem
qualquer crédito, mesmo que amparado em acordo homologado judicialmente, mas
questionável. Com isso, as empresas compradoras dos créditos realizavam
transferências bancárias ou entregavam cheques para Euda Maria Lacerda para o
pagamento das transações aos integrantes do grupo com o claro objetivo de
desviar receitas do Estado do Maranhão, oriundas dos tributos compensados, em
proveito próprio ou de terceiros”, afirma, na ação, o promotor de justiça Paulo
Roberto Barbosa Ramos.
FILTRO
Contribuía para a prática ilegal
a instalação de um filtro no sistema Siat, da Secretaria de Estado da Fazenda,
que mascarava as operações, limitando a visualização das transações. Com esse artifício,
qualquer usuário que utilizasse o sistema encontraria R$ 12.183.532,48 em
compensações realizadas. O valor real era de R$ 232.575.3012,11, muito
superior, inclusive, aos pouco mais de R$ 108 milhões em créditos devidos à
Camargo Corrêa.
“Portanto, Jorge Arturo Mendoza
Reque Júnior negociava créditos inexistentes da empresa Construções e Comércio
Camargo Corrêa S/A, uma vez que o filtro mascarava a informação real de que não
existia mais créditos a serem compensados”, observa Paulo Roberto Barbosa
Ramos.
O promotor de justiça destacou,
ainda, que, no período de 14 de abril de 2009 a 31 de dezembro de 2014, os
gestores ignoraram os procedimentos administrativos característicos da
administração pública ou simplesmente deram sumiço a eles após praticarem atos
ilícitos.
REATIVAÇÃO DE PARCELAMENTO
Outra prática que trouxe sérios
prejuízos aos cofres do Estado do Maranhão foi a constante reativação de
parcelamentos de débitos junto à Receita Estadual. Em apenas um caso, o impacto
foi superior a R$ 34 milhões.
Os envolvidos aproveitavam-se e
contribuíam para a inércia no aperfeiçoamento dos recursos tecnológicos da
secretaria, além da inexistência de uma rotina de controle interno, para
reativar parcelamentos de empresas em débito com o Estado. De acordo com a
auditoria, o sistema da Sefaz cancelava os parcelamentos com mais de dois meses
de atraso, com a consequente inscrição do débito na dívida ativa.
“Após esse cancelamento
automático, a única forma de parcelamento é através de intervenção humana na base
de dados da Sefaz – Siat. Esse tipo de intervenção não possui amparo legal e
constitui flagrante burla ao Fisco Estadual, uma vez que acarretam a suspensão
da exigibilidade de créditos tributários e eximem o contribuinte do efetivo
pagamento dos valores por eles devidos. Foi justamente isso que fizeram Cláudio
José Trinchão Santos e Akio Valente Wakiyama”, explica o autor da ação.
EXCLUSÃO DE AUTOS DE INFRAÇÃO
Além da reativação ilegal de
parcelamentos, era prática comum à época dos gestores acionados à frente da
Sefaz a exclusão de autos de infração do banco de dados da secretaria. Nesse
ponto, é difícil a mensuração do prejuízo ao erário, pois a exclusão dos dados
não deixou qualquer menção a valores nas trilhas de auditoria do banco de
dados.
É importante notar, no entanto, o
crescimento desse tipo de prática. No período de 8 de janeiro de 2010 a 1° de
abril de 2014, durante a gestão de Cláudio Trinchão, foram detectadas 43
exclusões de autos de infração. Entre 2 de abril e 31 de dezembro de 2014, gestão
de Akio Wakiyama, portanto, esse número cresceu vertiginosamente, alcançando
1.831 exclusões não justificadas.
EMPRESAS
O Ministério Público enfatizou
que o esquema foi aperfeiçoado a partir de 15 de outubro de 2013 quando a
empresa Auriga Informática e Serviços Ltda. foi formalmente substituída em “um
nebuloso processo licitatório” pela empresa Linuxell Informática e Serviços
Ltda. Apesar disso, a primeira continuou a prestar os seus serviços, por meio
de aditivo contratual, ao mesmo tempo que a outra empresa estava formalmente
contratada para o mesmo trabalho.
A Promotoria aponta, ainda, que
alguns funcionários da terceirizada Linuxell Informática e Serviços Ltda. eram,
ao mesmo tempo, comissionados da Sefaz, demonstrando “a grande ousadia da
organização criminosa, respaldada pela convicção de que todos os crimes
praticados permaneceriam impunes”, segundo o promotor de justiça.
Além disso, a execução do
contrato também apresenta irregularidades como a não utilização de certificados
digitais exigidos, colocando em risco o sistema de informação da secretaria, e
a realização de pagamentos mensais superiores ao quantitativo de horas máximo
previsto no termo de referência, sem que houvesse qualquer controle da Sefaz em
relação às horas efetivamente trabalhadas pelos profissionais contratados.
O Ministério Público aponta, na
ação, que o valor pago a mais à Linuxell Informática e Serviços Ltda. é de
quase R$ 3,6 milhões.
PENALIDADES
Na ação, o Ministério Público
pede a condenação de todos os envolvidos por improbidade administrativa,
estando sujeitos à perda da função pública eventualmente exercida, suspensão
dos direitos políticos por oito anos, pagamento de multa de duas vezes o valor
dos danos causados ou 100 vezes a remuneração recebida à época, proibição de
contratar ou receber qualquer tipo de benefício do Poder Público, mesmo que por
meio de empresa da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de cinco anos,
além do ressarcimento integral dos danos.
No caso de Cláudio José Trinchão
Santos, o valor a ser ressarcido é de R$ 180.394.850,97. Para Akio Valente
Wakiyama, o Ministério Público cobra o ressarcimento de R$ 181.006.405,31. No
caso de Raimundo José Rodrigues do Nascimento o total é de R$ 221.601,86,
enquanto de Edimilson Santos Ahid Neto cobra-se a devolução de R$
303.612.275,55.
De acordo com o pedido do Ministério
Público, Jorge Arturo Mendoza Roque Júnior e Euda Maria Lacerda deverão
ressarcir, cada um, ao Estado, R$ 245.599.610,97. Da ex-governadora Roseana
Sarney Murad foi pedida a condenação ao ressarcimento de R$ 158.174.871,97.
Helena Maria Cavalcanti Haickel e
Ricardo Gama Pestana deverão retornar ao erário, individualmente, R$
153.905.456,57, enquanto Marcos Coutinho Passos Lobo teve apurada a quantia de
R$ 42.684.154,40 a ser devolvida aos cofres públicos. Todos os valores deverão
ser acrescidos dos devidos juros e correções monetárias.
O Ministério Público do Maranhão
requer, ainda, que a Justiça determine à Secretaria de Estado da Fazenda a
abertura imediata de um novo processo licitatório para a contratação de empresa
para a prestação de serviços de tecnologia da informação, com a posterior
rescisão do contrato firmado com a empresa Linuxell Informática e Serviços
Ltda. Até lá, a secretaria deverá adotar rigorosas medidas de segurança em
relação aos serviços prestados pela empresa. Fonte: CCOM-MPMA
Comentários